Críticas

Dinossauros

de Santiago Serrano

Cena Promoções Culturais

 

brasilia

Festival Internacional de Rio Preto

Festival Internacional de Londrinas

Festival de Teatro Candango

1º Festival Brasilero de Teatro de Itajaí

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Brasilia

 

 

Dinossauros
Espaço Cena

10/11/2005 - 20/11/2005

O mais novo espaço cultural de Brasília será inaugurado com espetáculo que inicia ciclo de novas dramaturgias latino-americanas:
- Espaço Cena.

Madrugada.
Um banco de uma estação de trens, que também pode ser o banco de uma praça ou de rua qualquer. Ali se dará o encontro casual entre Silvina e Nicolás, dois desconhecidos, personagens aparentemente muito diferentes, mas unidos por um sentimento comum:

- A solidão.

A partir deste foco, o autor argentino Santiago Serrano cria situações inusitadas e muito poéticas no texto Dinossauros, escolhido pelo diretor e produtor Guilherme Reis para inaugurar o Espaço Cena, o mais novo espaço cultural da cidade, que abre suas portas no próximo dia 10 de novembro. Em cena estão os atores Carmem Moretzsohn e Murilo Grossi, dando início a um ciclo que pretende apresentar peças curtas da nova dramaturgia latino-americana. Dinossauros poderá ser visto até o dia 20 de novembro, de quinta a sábado, às 21 horas, e domingos, às 20 horas.

Dinossauros é um espetáculo que fala da sensibilidade e da busca da felicidade, num mundo cada vez mais opressor. Sentimentos como a ingenuidade, a ternura, a verdade caracterizam os personagens Silvina e Nicolás, desenhando-os como verdadeiros seres em extinção, como dinossauros que, para não desaparecer, precisam inventar um futuro possível. Silvina e Nicolás lutam pelo direito de escapar da rotina que comprime a alma, pelo direito de escolher ser feliz, de voltar a se apaixonar, de ser criança de novo, de abraçar a vida com o coração e os dentes, pelo direito de voltar a ter esperança. E estes simples direitos fazem com que os mais estranhos deste mundo, os dinossauros confundidos e extraviados nas ruas das grandes cidades, sacudam o pó dos tempos e voltem a ganhar vida, apostando, desta vez, em ser um pouquinho mais felizes. Afinal, nunca é tarde.

Os dois se relacionam a partir de jogos e confissões, apresentados com humor e emoção. Nesta obra, o autor Santiago Serrano busca sua poética na simplicidade da história e na linguagem terna e humana. A peça estreou em 1991, na Argentina, obtendo o prêmio de Melhor Obra Original e menção de Melhor Espetáculo no festival organizado pelo Centro Cultural General San Martín, de Buenos Aires. Em 2000, Dinossauros foi encenada no Canadá e nos Estados Unidos. Também recebeu montagens em Montevidéo, no Uruguai, e em Lima, no Peru.

O espetáculo inaugura um projeto de encenação de textos curtos de dramaturgos contemporâneos da América Latina. Durante os meses de novembro e dezembro, serão apresentados, no Espaço Cena, textos com tratamento simples e despojado. São encenações calcadas no trabalho do ator e na dramaturgia, com cenários e figurinos singelos.
O primeiro autor a ser contemplado pela série Novas dramaturgia é Santiago Serrano, psicólogo, dramaturgo e diretor nascido na Argentina, em 1954, que tem sua obra encenada em diversos países – o texto La revuelta já foi traduzido para o português. Em 1987, Serrano criou o Grupo Teatral Encuentros, com o qual realiza experiências teatrais até os dias de hoje.

Ficha Técnica

Autor - Santiago Serrano

Direção e iluminação - Guilherme Reis

Elenco - Carmem Moretzsohn e Murilo Grossi

Serviço
Dinossauros
Local – Espaço Cena  Endereço - CLN 205

 

 

 

 

DINOSSAUROS, ESPETÁCULO QUE INAUGURA O PALCO DO ESPAÇO CENA CONTEMPORÂNEA, ENALTECE A DRAMATURGIA DO ARGENTINO SANTIAGO SERRANO E O TRABALHO DE MURILO GROSSI E CARMEM MORETZSOHN.

 

CADERNO C

CORREIOBRAZILIENSE • Brasília, quinta-feira, 10 de novembro de 2005 • 5

SÉRGIO MAGGIO

DA EQUIPE DO CORREIO

 

Um banquinho, dois atores e um texto erguido com palavras simples. É assim, bem intimista, que o Espaço Cena Contemporânea inaugura seu palco. No centro, a dramaturgia latino-americana.

Feita aqui perto, na Argentina, mas desconhecida deste  país que fala português. A peça Dinossauros estréia hoje, rodeada dessa atmosfera de novidades.

A possibilidade de conhecer a obra de Santiago Serrano; o anúncio de um espaço que promete difundir as artes cênicas na cidade; a volta aos palcos do ator Murilo Grossi; e o seu encontro afetivo com o diretor Guilherme Reis e a atriz Carmem Moretzsohn.

Todos bons motivos acolhem a peça, que fica em cartaz até o dia 20, com ingressos a R$ 10.

O clima que envolve Dinossauros é de “faça você mesmo”. Às vésperas da estréia, os atores passavam o texto, ao mesmo tempo em que o diretor resolvia os ajustes finais do pequeno teatro de 50 lugares. A carpintaria técnica (iluminação, cenário e figurino) também foi construída pelo grupo. “A idéia é dar o primeiro passo, com a sensação de que estamos começando um processo de trabalho”, conta Guilherme Reis. Esse, aliás, é o tom da peça. Teatro na essência, cru, sem aparatos tecnológicos. Os atores e o texto. Chamado irresistível

A proposta atraiu o ator Murilo Grossi, que não pisava nos palcos desde a temporada de Cartas de um sedutor (2000). Fisgado pelo cinema (ele está em dois filmes no Festival de Brasília do Cinema Brasileiro deste ano) e até pelas telenovelas (O clone, de Glória Perez), o intérprete não resistiu ao chamado de Guilherme Reis, seu primeiro diretor. “Estava com

saudade física do teatro e não queria voltar em produção espetacular”, confessa.

A volta representa reencontro também com a atriz Carmem Moretzsohn, parceira da geração que movimentou a cena teatral nos anos 1980. “Fiz muito par romântico com ele”, confessa. Os dois trabalharam juntos em espetáculos como Eu matei Dulcina, de Alexandre Ribondi. Agora, estão lado a lado num texto que exige naturalidade e concentração para dizer cada palavra. Em Dinossauros, Murilo é Nicolás; Carmem, Silvina. Tragados pela solidão, os dois se conhecem num banco de espera, que pode ser de ponto de ônibus, estação de metrô ou trem.

Cena a cena, esboçam a possibilidade de futuro até então inexistente.

“Ficamos enternecidos com o texto”, conta Murilo Grossi.

“É lindo, uma dramaturgia de sutilezas”, completa Carmem.

A escolha do texto foi determinada ao acaso. Internauta profissional, Guilherme Reis navegou por bibliotecas virtuais e encontrou sites com textos de dramaturgos latinos, disponíveis para consulta e impressão. Baixou aleatoriamente alguns e todos começaram a leitura. “Quando a gente chegou em Dinossauros, a identificação foi imediata”, lembra.

“O contato com o autor foi impressionante. Contamos qual era a nossa intenção, nosso projeto, e a resposta dele foi linda. Disse que toda a sua obra estava à disposição”, acrescenta Carmem.

A peça estreou na Argentina, em 1991, e já foi encenada no Canadá, Estados Unidos, Uruguai e Peru.

Por ela, o autor ganhou prêmios pelo texto original.

Depois de Dinossauros, o Espaço Cena Contemporânea segue com o ciclo de novas dramaturgias latino-americanas. A idéia não é criar uma companhia, mas agregar artistas que queiram encenar desconhecidos. “Não queremos experimentalismo. Buscamos o fundamento do teatro, texto e ator”, adianta Guilherme, que planeja fazer do espaço extensão do festival Cena Contemporânea.

 

  

Encontro marcado

 

Sérgio Maggio

 
Da equipe do Correio


Os atores Murilo Grossi e Carmem Moretzsohn costumam rir das mesmas coisas. A cumplicidade afiada vem do tempo em que Brasília experimentava teatro, música e dança. No marco zero da década de 80, os dois começaram a pisar no palco. Por motivações diversas, acabaram transformando o teatro no principal território. Ali, conheceram-se melhor, dividiram amigos e compartilharam até o mesmo texto. Pegaram estradas diferentes. O ator migrou por outras linguagens (cinema e televisão). A atriz dividiu os camarins com a profissão de jornalista. Mas nunca deixaram de estar ligados por um fio de história em comum. Agora, reverenciam o aplauso da platéia que assistem ao belo espetáculo Dinossauros, em cartaz até amanhã no Espaço Cena Contemporânea (205 Norte). Ao completar 25 anos de atuação, eles brindam as trajetórias seladas, sobretudo pelo respeito ao teatro, que os acolheu e os transformou em nomes de referência nas artes cênicas do DF.

   

Crítica
Ode ao singelo



Poucos atores podem comemorar 25 anos de carreira com um espetáculo tão feliz como Dinossauros. Murilo Grossi e Carmem Moretzsohn protagonizam pequena pérola do teatro produzido em Brasília. Os dois puxam de si toda a experiência para dar movimento à montagem centrada na simplicidade. Sem parafernálias de cenário, trilhas, figurinos; sem artifícios de dramaturgia; sem caricaturas e máscaras de direção. Estão de cara e talento limpos em espetáculo de teatro cru.


A harmonia de Dinossauros parte do texto do argentino Santiago Serrano, um achado do diretor Guilherme Reis. De construção humanista, a peça ergue personagens que ultrapassam o arquétipo do solitário urbano. E se sustenta completamente na essência do casal, delineada a cada palavra. É uma peça cuja ação dramática está na conexão das idéias. Não dá para perder um artigo, uma vírgula.

O texto apaixonante cresce com a direção generosa de Guilherme Reis, que o entrega de presente ao trabalho dos atores. O diretor também mantém o texto no ritmo da sutileza, evitando cair em excessos. Há duas cenas (quando a personagem Silvina dança e quando o casal brinca na rua) em que o humor poderia beirar o rasgado. Em cena, Murilo Grossi parece gigante nos primeiros momentos. A sensação é de que vai engolir Carmem Moretzsohn. Mas o equilíbrio vem de imediato. A personagem Silvina é determinante para a condução da trama – em muitos momentos, aliás, ela a conduz. Carmem se aproveita bem dessas reviravoltas e marca a personagem, num bate-bola de primeira entre os dois atores. Juntos, levam a platéia ao trânsito de emoções, da mais singela à pungente. (SM)

 

 

 

 

 

 

Outro teatro é possível

 

Tenho um amigo que um dia me perguntou, muito injuriado, por quê dessa mania do teatro hoje de querer re-inventar a pólvora. Ele andava meio incomodado com os exageros da improvisação e do experimentalismo, e com a incansável (e, de acordo com ele, bastante cansativa) mania do teatro contemporâneo de querer reinventar-se a si mesmo, buscando fazer com que a forma, e não o conteúdo, incorpore as rupturas e as descontinuidades da condição pós-moderna. “Por que não fazer Shakespeare?”, ele me perguntava inconformado. “Por que não reaproveitar os bons e velhos clássicos?”. Eu ouvia essas perguntas todas e pensava, deixava-as ecoar e ressonar na minha cabeça – tentava ver chegarem as possíveis respostas.

 

Honestamente não lembro o que respondi, se é que respondi alguma coisa. Provável que tenha dito alguma amenidade, só para constar audiência – porque não me lembro de termos entrado em nenhuma polêmica ou discussão mais elaborada sobre o tema. Mas ontem à noite, após assistir à peça “Dinossauros”, do argentino Santiago Serrano, uma possível resposta ao meu amigo me veio à cabeça.

 

A peça reúne, sob a direção de Guilherme Reis, dois grandes atores brasilienses: Carmen Moretzon e Murilo Grossi. Num palco bem pequeno, sentados num banco de praça e sob um fundo azul, os dois desvelam um texto suave e divertido, um diálogo que constrói sutilmente uma relação de intimidade das personagens entre si e com o público. Opta-se pelo simples, pelo essencial: bom texto, bons atores. Cria-se a atmosfera: o público está no teatro, não há dúvidas, e é nesse espaço mágico, de suspensão momentânea, em que permanece durante os 50 minutos de peça. E funciona.

 

A desconstrução pós-moderna não deixa de estar presente, mas está dentro de cada personagem, dentro de cada história, de cada discurso. As angústias, as crises, as irrecuperáveis quedas, a tensão dos tempos e das gerações, a convivência desencontrada de cada um de nós, anjos caídos que somos, com cada nova época que surge.

 

Saí de lá comovida. Pela história, pela experiência teatral revivida e pela percepção de que o teatro se renova e segue muito vivo, de que não precisa ser ou Shakespeare ou Gerald Thomas para ser bom, para provocar, para inovar e emocionar. Que Shakespeare tenha inventado o humano eu até concedo – e que algum experimentalismo nas formas seja revigorante e necessário também. Mas entre esses dois extremos há certamente um mundo de outros teatros possíveis.

 

Nina Madsen

 

 

 

 

 

Festival Internacional de Rio Preto

 

 

 

 

 

JORNAL "HOJE EM DIA", Belo Horizonte, 22/07/2006

Bons atores sobressaem em ‘Dinossauros‘

 

Miguel Anunciação*
CRÍTICO/ ESPETÁCULOS

São José do Rio Preto (SP) - Vasta quilometragem no teatro, rigoroso até, o diretor teatral e curador do FIT/BH, Eid Ribeiro - dizem - levantou e foi embora, com pouco menos de 15 minutos de sessão. Convenhamos, “O Que você foi quando era criança?” é realmente bastante difícil de acompanhar até o final. Não porque dure 1h30 - “Ensaio.Hamlet” e “Assombrações do Recife Velho” duram duas horas, cada. Quem não estiver instalado numa arquibancada rija, mal perceberá o tempo correr. Teatro bom faz o tempo fluir.
Eid esteve aqui, participando da reunião do núcleo dos grandes festivais internacionais, e conferindo alguns espetáculos. Detestou a montagem de estréia da Cia da Mentira, de São Paulo, composta por egressos do grupo de Antunes Filho. O texto é de Lourenço Mutarelli, estimadíssimo quadrinista e escritor paulista, o cenário do mineiro André Cortez e o elenco é respeitável, alinha jovens atores de estatura. Acontece que a direção, co-assinada por Gabriela Flores e Donizeti Mazonas, adota um tom de comédia, que joga contra as sugestões contidas no texto. O chamado tiro no pé.
Instalado num espaço menor, para menos de 100 pessoas, “Dinossauros” não cria a expectativa de ser pretensiosa. Escrita por Santiago Serrano, dirigida e iluminada por Guilherme Reis, coordenador do festival Cena Contemporânea de Brasília, traz dois personagens à cena (Murilo Grossi e Carmem Moretzsohn), dois sujeitos à mingua, sem perspectivas futuras, que se encontram por acaso em noite alta.
Ele foge de um casamento sem afetos, uma esposa agressiva, um emprego sem eiras; ela se permite uma folga na agenda de solteirona, apegada à mãe doentia, sem entregas amorosas. A encenação ilustra este encontro fortuito num banco de praça, entre suposições descabidas e projeções de parte a parte. É uma situação recorrente na dramaturgia, seja no teatro, no cinema ou na TV. Sujeitos desgarrados, que conquistaram pouco ou perderam muito, em busca de refúgio ameno, caloroso.
Nestes casos, importa menos se aquilo o que vemos não corresponde ao que já vivemos, se mantém os pés na realidade. Completamos o que a cena carece de veracidade com nossas próprias fantasias de um encontro mágico, redentor, com nossas projeções de libido. Bons atores, sedutores, Murilo e Carmem se instalam bem nos limites dispostos pela direção, numa cena terna, recatada, na qual o desejo ameaça prevalecer em várias instantes. Permanecerá assim, se equilibrando no meio, sem avançar sinais. Não avançará, sob pena de alcançar o terreno do pornô ou ter a cara que o afeto dos atores imprimir.
Qualquer passo além do previsível trairá o que desejamos que aquilo seja, nosso segredo contado por outros. De preferência, que não termine em algo feliz para não parecer piegas. Apenas deixe no ar uma promessa, que possamos preencher as lacunas conforme nossos interesses, nossas necessidades. Violando a praxe, “Dinossauros” acaba firmando um princípio de felicidade discreta. Talvez por isso, nos parece simpático, agradável, além das outras qualidades que ele possui.


* Viajou a São José do Rio Preto a convite do Festival de Teatro.

 

 

 

 

Críticas: Kil Abreu | "Dinossauros" | 24/7/2006

  

"Dinossauros"
Cena Promoções Culturais
Brasília/DF




Os Dinossauros, nossos irmãos



Os Dinossauros de Santiago Serrano, autor argentino revelado no FIT pelo pessoal de Brasília, são sujeitos antes de tudo vitimados por paixões tristes. O apelo dramático da peça, costurada com os fios de um lirismo comovente, é justo o de mostrar delicadamente as feridas abertas de cada um – que podem ser as nossas próprias – e, com esperança indisfarçada, pôr sobre elas o bálsamo que lhes diminui a dor.

A história de dois estranhos que se encontram casualmente sentados no mesmo banco de uma estação, guarda, no texto, algum parentesco com a dramaturgia de um teatro absurdo e existencialista. De fato, se a coordenada principal da narrativa se apóia ainda no realismo, a síntese poética proposta pelo autor não mostra interesse pelos detalhes e explicações que dariam sustentação rigorosamente verossímil à cena. Pelo contrário, os diálogos se seguem propositalmente no ritmo urgente das histórias que têm pressa em chegar ao final. E é este andamento ao mesmo tempo cotidiano (porque reproduz uma situação possível) e estranho (porque esta situação evolui de um ponto ao outro em um tempo forjado) que alimenta o charme e a teatralidade do espetáculo.

É sem muitas mediações que os lances da vida pessoal vão ganhando espaço. Nicolas, que gostaria de saber tocar o instrumento que carrega, é um sujeito pinçado de algum livro de Dostoievski: apanha da ex-mulher e sai a perambular com uma garrafa de vinho embaixo do braço. Silvina, que gostaria de saber cantar, se acha pouco atraente, uma “antiguidade ambulante”, e conjuga os verbos sempre no passado. O desfile de desejos nos planos de vida de ambos, e suas correspondentes interdições, só reforça a grande falta que os aproxima e os leva a avançar da queixa ao impulso criativo da mudança. Se por um lado esses animais “errados” não podem sair de suas próprias peles para saciar suas idealizações, por outro são capazes de assumir o princípio de realidade, em resistência pactuada que os redime momentaneamente.

A montagem dirigida por Guilherme Reis encontra os caminhos acertados para valorizar tanto o material dramatúrgico quanto o trabalho dos atores. Não se preocupa em referenciar o palco com imagens outras que não venham através da palavra. Um banco e um fundo azul é solução cenográfica que esvazia propositalmente as circunstâncias espaciais para que a cena seja mantida concentrada em uma espécie de suspensão poética. O artifício é muito feliz.

O trunfo principal, porém, está na dupla de atores brasilienses. Carmem Moretzsohn e Murilo Grossi cumprem com a tranqüilidade dos veteranos, em desempenhos comoventes, as nuances que vão do sentimento de trágico abandono às tentativas, por vezes cômicas, de respiro das personagens. Pequena grande jóia, a montagem reafirma a potência de um teatro econômico nos recursos materiais e valioso no resultado artístico.


Kil Abreu

 

Kil Abreu – de São Paulo: Pesquisador de teatro, crítico, jornalista, compõe a banca de jurados do Prêmio Shell e da APCA, e participa da curadoria do Festival de Teatro de Curitiba

 

 

 

 

 

Críticas: Edelcio Mostaço | "Dinossauros" | 23/7/2006

"Dinossauros"
Cena Promoções Culturais



DELICADEZA



Nascido de um diálogo com a dramaturgia latino-americana o espetáculo “Dinossauros” veio ao FIT através das mãos do encenador Guilherme Reis. O autor é o jovem Santiago Serrano, da nova safra de autores que abastece o concorrido teatro argentino. O texto, em sua arquitetura e meios expressivos, é bastante simples, desde logo afastando qualquer conotação de simplismo, organizado pelo encontro, ocasional e fortuito, entre uma moça solitária e um homem de meia idade que dividem um mesmo banco de praça.


Todo o interesse dramático está no estudo dos caracteres. Ela é tímida, introspectiva, produto de uma existência pouco ousada, colocada num momento de crise em função da doença da mãe. Ele é casado, perspicaz observador das atitudes alheias, aberto às novas emoções e se descobre capaz de interessar-se por ela.


É o quanto basta – dois atores, um tablado e uma paixão – para ensejar este pequeno estudo de psicologia efetuado, essencialmente, em cima das reações que um provoca no outro. Nesse sentido, a direção de Guilherme Reis mostra-se enxuta, interessada em guiar os intérpretes ao encontro dos gestos mais adequados, das inflexões mais ajustadas, ajudando-os a desenhar os perfis que, pelo acúmulo de pormenores, vão desvendando as duas criaturas ao espectador.


Carmem Moretzsohn imprime à jovem total credibilidade e densidade, numa composição dramática perfeitamente adequada em seus gestos e inflexões. São sempre encantadoras suas atitudes diante das descobertas, dos inesperados, da sucessão de incidentes que, ao longo da trama, a deslocarão da introspecção à entrega sensível. Murillo Grossi incumbe-se da figura masculina, aliando em sua pessoa dois traços significativos: a simpatia e o comedimento. Eles vão se revelar essenciais para que sua criação não ultrapasse os limites entre a vitalidade existencial e a falta de compostura diante de uma mulher que encontra pela primeira vez.


Embora algumas intimidades sejam reveladas um ao outro, tudo permanece na zona sombreada do pequeno mistério, o que adensa e estimula a imaginação do espectador. Esse o mérito maior desta encenação.


Divulgar a produção cênica de nossos irmãos de continente é um projeto mais do que bem vindo, não apenas pelo interesse mútuo, mas, especialmente, pelas possibilidades de diálogos criativos que podem resultar.

Edélcio Mostaço – Florianópolis: Crítico teatral, ensaísta, professor formado em Direção Teatral e Crítica pela USP com vários trabalhos publicados, participante ativo de festivais de teatro no Brasil e exterior.

 

 

 

  Beth Néspoli

Se a arte é suspensão de rotina, festivais de teatro são eventos que interferem sobre a rotina de ir ao teatro. Mobilizado, tendo de fazer escolhas entre programação vasta e em tempo concentrado, o espectador espera ser surpreendido. O Festival Internacional de Teatro de São José do Rio Preto, cuja 6ª edição terminou no domingo, talvez seja a mostra de artes cênicas brasileira que mais consciente e criticamente explora essa atmosfera cultural instaurada.

Na programação dos dez dias do FIT Rio Preto predominou o teatro que foge do óbvio, que busca refletir as inquietações de seu tempo, descartando formas, e fórmulas, desgastadas. Havia algumas criações de alto risco como Ensaio. Hamlet e Otelo da Mangueira cujo resultado, já se sabia, era de amplo alcance de público. Num outro extremo, o solo Sopro, do Grupo Lume, com igual qualidade, exige um espectador com disponibilidade de desprender-se do ritmo cotidiano e compartilhar uma percepção de tempo bem diferente do acelerado ritmo urbano. Também estava lá.

Louvável no FIT Rio Preto é a coragem de arriscar, mesmo sabendo que isso implica também o equívoco da falsa inovação, do espetáculo novidadeiro. Para compensar possíveis equívocos, a organização teve a ousadia de unir provocação e reflexão. Nesta edição, seis críticos foram convidados a escrever num jornal diário, editado pelo FIT e com distribuição farta e gratuita. Cada espetáculo mereceu duas visões críticas, análises argutas de especialistas como Tânia Brandão e Kil Abreu, só para citar dois exemplos. Um luxo em tempos de espaço reduzido para o pensamento que deu a artistas e público elementos para ampliar sua fruição dos espetáculos. E ainda pode tornar-se instrumento valioso para a curadoria rever acertos e erros.

Na reta final da programação, cujos últimos quatro dias foram acompanhados pelo Estado, destacou-se Les Feuilles qui Résistent au Vent, espetáculo africano de dança contemporânea do coreógrafo Koffi Kôkô, nascido em Benim. Defronte de uma imensa seringueira, a céu aberto, em chão de terra, diante da linha do trem - que passou apitando forte no meio da apresentação - Koffi dançou, com outros seis artistas da Nigéria, de Benin e de Burkina Fasso. Nesse espetáculo, cuja música é executada ao vivo, se revela uma África potente, sagrada, plena de dignidade, mesmo que também dilacerada pela dor e pela violência, porém capaz ainda de humor e, sobretudo de extrema sofisticação. Um espetáculo que poderia estar lado a lado com coreografias de Pina Bausch ou Wim Vandekeybus.

Aparentemente singelo e despretensioso, Dinossauros, dueto de dois ótimos intérpretes, Carmem Moretzsohn e Murilo Grossi, foi outro destaque na reta final do FIT. O encontro de dois desconhecidos que dividem um banco, de madrugada, numa cidade, começa por um estranho atrito entre o aparente realismo do texto e a inverossimilhança da situação. Mas aos poucos a fabulação, já presente no cenário indefinido, vai se mostrando e a montagem alcança o raro feito de retratar algo pelo seu oposto: a aridez do espaço urbano e sua interferência nas relações humanas se revela no comportamento improvável do casal de 'dinossauros', que faz até piquenique em banco de praça.

Realizado pela prefeitura de Rio Preto e pelo Sesc São Paulo, com patrocínio da Petrobrás, o FIT Rio Preto mais uma vez mostrou que surgiu com fôlego para permanecer e inteligência para fazer diferença.

A repórter viajou a convite da organização do Festival

 

 

 

Festival Internacional de Londrinas

   

 

  Folha de Londrina

ARTES CÊNICAS - Teatro em estado puro
Dinossauros traz a história de um casal em espetáculo sem artifícios ou preciosismos

Ao empilhar sobre o trabalho do ator a sensibilidade de um texto contemporâneo argentino, a peça ''Dinossauros'', estréia de hoje no FILO, às 20 horas, no Teatro Crystal, não enrola para dizer que até na solidão há um fio de poesia.

Para contar essa história, os atores Carmen Moretzsohn e Murilo Grossi, com direção de Guilherme Reis, abrem no palco o texto do argentino Santiago Serrano, deixando que o público compartilhe da ruptura da vida dos dois personagens.

Um homem que atravessa a solidão com o fim do casamento, encontra no mesmo ponto existecial uma mulher, que sofre com a morte da mãe.

Nesse encontro, eles se abrem rapidamente para ler a poesia impressa na pessoa do outro que, apesar de estranha, é alguém que se torna conhecido pelos conflitos que são semelhantes.

O público também acaba se reconhecendo no espetáculo.

''O texto é muito simples e nem chega a ter um conflito, mas ao ser bem construído se torna uma inquietante dramaturgia'', avalia o diretor Guilherme Reis.

A montagem nasceu a partir de uma pesquisa sobre a dramaturgia Latino Americana, que na avaliação do elenco, tem pouca visibilidade. ''Começamos a procurar textos em pequenos formatos, principalmente os argentinos, e chegamos ao Serrano'', completa o diretor.

Reis e Carmen identificam vários dinossauros andando pelas ruas, como os dois personagens da peça.''As pessoas assistem o espetáculo com um sorriso nos lábios'', afirma Carmen ao acrescentar que a identificação do público com as situações completa a poesia que há no texto.
 

 

 

Festival de Teatro Candango

Rio de Janeiro- 2006

 

TEATRO: ESPECIAL
Mostra de Teatro Candango
Cena contemporânea de Brasília ganha contornos no Rio através dos premiados espetáculos Dinossauros, Adubo - Ou a sutil arte de escoar pelo ralo e O rinoceronte que marcam a volta do mestre Hugo Rodas à cidade


O Espaço Sesc, em Copacabana, promove a Mostra de Teatro Candango, que apresenta três das principais montagens realizadas na cena teatral contemporânea de Brasília em 2005 - as peças Dinossauros (3, 4 e 5 de março), Adubo - Ou a sutil arte de escoar pelo ralo (8 a 12 de março) e O rinoceronte (15 a 19 de março). Idealizado pela produtora cultural Claudia Charmillot, brasiliense radicada na capital fluminense, o panorama tem como principal objetivo aproximar o público do Rio do mosaico de linguagens que permeia hoje os palcos do Distrito Federal. Mosaico este fomentado dinamicamente através de nomes como o premiado Hugo Rodas, teatrólogo uruguaio há 30 anos radicado no Planalto Central, onde formou gerações de atores, além de ter assinado algo em torno de 70 espetáculos marcados por uma original e séria pesquisa de elementos da cena.

Da cepa de Hugo, aliás, dois premiadíssimos e inquietantes trabalhos serão apresentados na Mostra: Adubo - Ou a sutil arte de escoar pelo ralo, criação coletiva de atores recém-saídos da Faculdade de Artes Cênicas da Universidade de Brasília (UnB), e O rinoceronte, livre adaptação da obra de Eugène Ionesco, que chegam ao Rio trazendo na bagagem seis estatuetas do II Prêmio Sesc de Teatro Candango, realizado em novembro do ano passado. O terceiro espetáculo a compor a Mostra é o não menos incensado Dinossauros, do argentino Santiago Serrano, direção de Guilherme Reis, eleito um dos cinco melhores encenados em Brasília em 2005.

 

Os espetáculos

 

A montagem de Dinossauros comemora os 25 anos de trajetória dos premiados atores Murilo Grossi e Carmen Moretzsohn e vai além: quer jogar luz na dramaturgia da América Latina. Encontramos Dinossauros num banco de textos na Internet. Essa peça do argentino Santiago Serrano foi encenada em vários países, como os Estados Unidos, e teve enorme repercussão. Me interessa a pesquisa dramatúrgica e sinto falta deste intercâmbio dentro do Brasil mesmo onde desconheço a existência de um site de dramaturgia, por exemplo , destaca Murilo Grossi.

Criado por quatro atores de Brasília, Adubo - ou a sutil arte de escoar pelo ralo é um espetáculo perturbador que não economiza na pesquisa teatral. Unindo as várias passagens em que se desenrola a peça está a morte e o morrer. O trabalho investiga poeticamente este misterioso momento com o qual todos os seres vivos, cedo ou tarde, se encontrarão. Por meio de vários personagens, ora grotescos, ora cômicos, fala da morte com serenidade, mostrando que ela é apenas parte de um ciclo natural. Leve em seu ritmo e profundo em seu conteúdo, o espetáculo enaltece o valor da vida. Já que a morte é a única certeza: - goza a vida enquanto a tens!

Os atores André Araújo e Rosanna Viegas também integram o elenco d´ O Rinoceronte (foto), livremente inspirado na obra de Ionesco. Espetáculo vencedor de sete prêmios no FENTEPP (Festival Nacional de Teatro de Presidente Prudente - SP) de 2005: melhor espetáculo; melhor espetáculo pelo júri popular; melhor figurino; melhor maquiagem; melhor atriz (Rosanna Viegas); melhor ator (André Araújo) e melhor ator coadjuvante (Diego Bresani).

Ficha Técnica da Mostra de Teatro Candango:
Idealização e Produção geral - Claudia Charmillot;
Assistente de produção - Ive Martins;
Projeto gráfico - Guilherme Reis com colaboração de Pedro Martins.

 

 

1º Festival Brasilero de Teatro de Itajaí

 

 

Dinossauros

 

Ao iniciar o espetáculo Dinossauros, não tive como não associar a imagem de abertura da montagem – aquele fundo de madrugada azulada, o perfil da atriz sentada no grande banco, a percepção de que estávamos num exterior – com a imagem inicial de uma outra peça, A história do zôo de Edward Albee. Lembro disso porque as imagens poéticas oriundas ou associadas aos textos além de engravidarem uma emoção ou estabelecerem um pensamento em função da cena, elas constituem a memória do próprio teatro: dois homens sentados à beira de um caminho diante de uma árvore; uma mulher no alto de um balcão e seu amante no chão a falar-lhe; um homem sentado na cadeira do dentista; uma mulher enterrada até o pescoço; uma jovem a tocar o seu piano; duas irmãs que amam o mesmo homem; entre outras tantas lembranças que nem sempre estão, é verdade, no início da encenação, mas ficam alojadas em nossos bancos de memória depois do espetáculo ou após a leitura do texto.

A particular beleza do texto de Santiago Serrano está no estabelecimento de uma progressão simétrica dos comportamentos apresentados. Como se fossem o botão de uma flor que pouco a pouco vão, mutuamente, se abrindo um para o outro. Cada personagem vai deixando para trás seu estado anterior, fechado e recolhido sobre si mesmo, para se abrir na direção do outro, reconhecendo a sua solidão na solidão do outro. Dando provas de que a humanidade ainda é possível. E conseqüentemente partilhando a noite, o banco, a comida, o vinho, a música, e a lembrança do que foram quando crianças.

O texto manifesta que se a estupidez humana é geral e ostensiva, a generosidade e a bondade estão nestes pequenos gestos particulares entre o acolher e ser acolhido, o ouvir e ser ouvido. Silvina e Nicolas graças aos seus comportamentos e seus princípios de solidariedade humana são como dinossauros em extinção, metáfora do título da peça somente revelada no final, à leitura da notícia do jornal.

A proposta de direção que Guilherme Reis aplica ao texto, com sua direção sensível à escuta da palavra do autor, pavimenta o caminho para atuação serena dos atores. A direção potencializa a relação do casal de desconhecidos emoldurando-a sob um foco de luz que tem como suporte, ao fundo, este azul da madrugada com um leve toque cinematográfico. A partir deste recorte visual, a direção se detém em trabalhar nos pequenos detalhes deste encontro inusitado: a respiração, o olhar, o gesto, o tempo.

O casal de atores, Carmem Moretzosohn e Murilo Grossi, explora com um equilíbrio muito delicado as nuanças destes comportamentos impressos no par Silvina e Nicolas. A dificuldade de dar credibilidade à história de cada um desses dois solitários é facilmente superada a partir dos jogos infantis. Os atores nos mostram por meio de uma atuação emocionada que Silvina e Nicolas são estes adultos de hoje por conta da criança que foram no passado. O jogo dos atores é inteligentemente alimentado por este vai e vem entre a espontaneidade da criança e a dura couraça do adulto. Reféns da criança que foram, Silvina e Nicolas não podiam ser adultos diferentes do que são mostrados em cena.  E é daí que emana, da dupla de atores, este estado de comoção permanente do espetáculo que se mantém vivo do início ao fim da encenação.

 

 

Walter Lima Torres